Seguidores

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Tropa de elite 2 ou o reflexo de uma democracia em ruínas


Dizem que não devemos espalhar aos quatro ventos aquilo que fazemos. Concordo plenamente, mas vez por outra, desde que surgiu o fenômeno da opinião pública, no século XVIII, recentemente estudado tenazmente pelo historiador Roger Chartier (As origens culturais da Revolução Francesa), a tentação de se expor, juntamente com determinadas ideias, é grande. Eu sou bastante míope. Logo mais, dentro de aproximadamente duas horas estarei me submetendo a um processo cirúrgico que espero sanar essa limitação que me acompanha desde os 7 anos de idade. Então, tenho grandes esperanças que este seja meu último post que eu redija me valendo de lentes de contato ou óculos, como costuma acontecer. Já que iniciei o mote falando sobre visão ou pontos de vista, gostaria de expressar minhas impressões sobre o filme nacional Tropa de Elite 2, campeão de bilheteria em todos cinemas do país.

Fica evidente, desde o primeiro filme, que as incursões de Capitão Nascimento e do fiel Matias ao submundo do crime, marcadas pela banalização da violência, organizado no Rio de Janeiro é apenas o estopim que acionam problemas estruturais bem maiores. Tropa de Elite 2 aprofunda essa tendência, colocando lado a lado o antagonismo de ponto de vista daqueles que reprimem o tráfico de drogas a mando do Estado, regido pela batuta de políticos metidos em transações nada decorosas, da mídia, de uma PM degenerada e corrupta e daqueles que alimentam aquela visão romantizada sobre os criminosos brasileiros, os taxando como vítimas de um sistema excludente.

Sobre as Ong´s pró-Direitos Humanos, eu acho bastante contraditório o fato da grande maioria dessas instituições serem financiadas aqui, no Brasil, pelo capital estrangeiro oriundo de países que são conhecidos pelo modo enérgico que suas forças policiais atuam e pela rígido código penal que rege as suas constituições, abrindo brechas, inclusive, para a pena de morte e para a condenação de menores de acordo com a gravidade dos crimes cometidos pelos mesmos. O fato é que uma nação jamais será uma potência enquanto continuar traumatizada pelo crime e pela violência. Isso parece interessar à essas Ong´s. Alguém acredita que trancafiar um sujeito por alguns anos em uma pocilga promíscua e infecta vai regenerá-lo? Eu também não acredito nisso, mas se alguém falar em fazer uma reforma presidiária na qual os presos sejam obrigados a trabalhar, de forma forçada, para sustentarem a despesa que dão aos cofres públicos e na qual nossos queridos menores infratores, protagonistas de assassinatos e crueldades das mais hediondas, que podem votar aos 16 anos, possam ser julgados como adultos, logo o pessoal das Ong´s correm em defesa para deixar as coisas como estão (indo de mal a pior).

Ao fim do filme, a platéia aplaudia tímida e um longo silêncio se fez entre o público que caminhava em direção as saídas do cinema. A atuação de uma Polícia Militar, corrompida, herança da Ditadura, que é impotente diante do crime organizado e que só é competente naquilo que fazia de melhor na época dos militares, ou seja: reprimir manifestações de insastifação popular e também a empreitada de pessoas que se arvoram em defender psicopatas genuínos, de chocar qualquer serial killer norte-americano, como se fossem os pobres coitadinhos da história é uma evidência do quanto a democracia vivenciada no Brasil é teatralizada, mutilada e demagógica. Democracia na medida em que sirva para atender os interesses de uma elite que não é militarizada, mas que sabe, bem mais do que a turma do Capitão Nascimento e dos traficantes, como usar o medo e a força bruta para fazer valer sua hegemonia.

Ao final do filme, a mesma impotência do Capitão Nascimento, sentida quando este afronta as forças maiores da corrupção e do tráfico de influência política, transformado de uma figura autoritária em, praticamente, quixotesca é a impotência de todos nós. Daí porque eu nunca tinha presenciado uma platéia sair de uma sala de cinema, na qual um filme aclamado estava sendo exibido, tão cabisbaixa.




terça-feira, 12 de outubro de 2010

Nos bastidores de "Ronda da noite" de Rembrandt

Bom, antes de tudo, não se trata de um post com link para download. Trata-se apenas de uma dica cinematográfica. Nesse feriado, aproveitei, entre outras coisas, para ver alguns filmes e pude adquirir a película Ronda da noite (2007), dirigida pelo inglês Peter Greenaway. É interessante perceber como Greenaway retrata o cotidiano do pintor holandês Rembrandt (1606 - 1669), que foi um dos grandes mestres da pintura européia e um exímio dominador do emprego dos efeitos da sobra e da luz na pintura, bem com as tramas que envolveram a pintura do polêmico quadro Ronda da Noite.


Para Greenaway, por meio da pintura Ronda da Noite, que deveria representar um grupo de burgueses em poses heroícas prontos para defender Amsterdã, Rembrandt realizou uma denúncia de assassinato. O crime teria sido cometido a mando da figura central do quadro. Então, por meio de pistas simbólicas, manifestadas de forma alegórica, como, por exemplo, a garotinha que aparece correndo em meio a tropa, que seria a filha bastarda do líder da milícia, o pintor holandês almejava colocar sob suspeita também a índole moral e ombridade dos soldados. Essa intenção é nítida nos traços afeminados de dois milicianos, a direita do quadro, que segundo Greenaway, eram enamorados e na forma desengonçada pela qual um dos soldados carrega seu mosquete, a esquerda.

Rembrandt realizava seus desenhos e pinturas com uma precisão cirúrgica. Para ele, ao imortalizar uma pessoa em um quadro, o contexto que a cercava deveria ser também relevante. Por isso, o pintor holandês representava seus modelos de acordo com a personalidade que achava que eles possuíam. Daí justificar porque quase sempre pintava as pessoas com cara de idiotas. Baixinho, atarracado e de personalidade forte, além do profundo abalo emocional que sofreu com a morte de sua esposa, Saskia, Rembrandt teve de lidar com o ostracismo e a miséria após perder o prestígio e proteção dos mecenas com à realização do quadro Ronda da Noite. Mas para muitos historiadores da arte, esse fato também foi fomentado devido ao estilo de pintar do artista, que já estava perdendo espaço nos salões de arte.

Fica essa dica de filme. Ronda da noite não é para ser visto apenas por amantes da arte. A trama policialesca que envolve todo o filme, as representações do cotidiano conturbado, bem humorado e dramático do pintor e a atuação genial de Martin Freeman como Rembrandt possuem todos os elementos que um bom filme precisa. Pode ser até que para uma pessoa ainda não iniciada no universo da interpretação das obras de arte, Ronda da noite sirva como estímulo para que essa pessoa busque realizar suas próprias interpretações sobre obras de arte. Êis aí um dos grandes méritos do filme de Greenaway.




terça-feira, 5 de outubro de 2010

Lançamento do livro Solfejo de Eros

Com muita satisfação, gostaria de divulgar ao pessoal que frequenta este blog, de João Pessoa à Campina Grande, que a poeta Anna Apolinário estará lançando seu livro de poemas "Solfejos de Eros" no dia 29 de outubro de 2010, no Sebo Cultural (Av. Tabajaras, 848 - Centro de João Pessoa), às 18 horas. Não é sempre que um(a) leitor(a) deste espaço virtual é alguém que está consolidando sua relação com o mundo das letras por meio de uma publicação. A noção que tenho é que Anna Apolinário constrói seus versos bebendo de excelentes fontes de inspiração que vão do francês Baudelaire, dos portugueses Fernando Pessoa e Florbela Espanca, ao paraibano Augusto dos Anjos e o paulista Àlvares de Azevedo. Claro, à essas grandes referências poéticas, soma-se a criatividade e as vivências ontológicas da poeta, expressadas de forma visceral e surreal, margeadas por uma leitura contemporânea que mescla o decantentismo romântico de fins do século XIX e começo do XX com uma escrita onírica e intimista, que me lembra os mestres da poesia e da literatura Beatnik, como Allan Ginsberg. Segue uma prévia, gentilmente cedida por Anna, do que pode ser encontrado pelos leitores nas páginas de sua obra:

Sinfonia Imaginária


Ela põe um beijo fálico

Nas minhas têmporas de outrora.

Traz qualquer coisa de vertigem

Na epiderme do descontentamento cardíaco

Vejo esse vagido na madrugada :

é um demônio verde a levantar meu vestido.


Emudeçamos todo desassossego

Com amores dadaístas

Encharcados de absinto

Pairamos sob o mundo inimigo,

em metamorfose de gozo e xamanismo.

Está escrito no livro primeiro do Uivo que iluminou Buda:

minha vênus profética vulvando em teu falo que confabula

O inventário do tempo

Foi comungar no Cabaré Místico

É teu verso?

Delira-mo

Sem paletó de poeta pixote

derrama teu inaudito vinho de menino lírico.

Azulei para um verde em dó maior

Encontre-me aquém do verbo


Os ciganos esconderam a Loucura

no porta-seios da Musa

O pingente de gelo da Poetisa

Incendeia o céu de querubins

Sob o dossel do Silêncio

vejo-o enfim átomo

Infindo unido ao balé de meu delta

Os olhos do Sonho solfejam o delírio:

uma sinfonia imaginária para o amante metafísico.

Anna Apolinário