Seguidores

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

De Albert Camus, com carinho, ao seu mestre.


Em meio ao turbilhão de textos que ando lendo, sejam para o mini-curso que será ministrado durante o II Colóquio Internacional de História da UFCG, para a seleção de doutorado e para o artigo que pretendo publicar, no citado evento, sobre o mercado editorial na Primeira República, não pude deixar de me envolver por um misto de encantamento e rejubilar ao adquirir a obra O primeiro homem do escritor argelino, que muitos insistem em taxar de francês, Albert Camus.
Chama a atenção o fato de O primeiro homem ser uma narrativa autobiográfica, como coloca Manuel Costa Pinto, sobre a impossibilidade da memória. pois o livro traz a tona alguns traços da história familiar do escritor como a morte precoce do pai, durante a I Guerra Mundial; a infância pobre em um bairro de Argel; a figura da mãe descendente de espanhóis surda e analfabeta; o tio toneleiro e a adoção intelectual pelo professor Louis Germain. Talvez ter crescido em meio a esse contexto adverso é que deu a fisionomia do escritor aquela expressão séria, própria de quem exerceu labores extenuantes e pouco remuneradores. Mas o autor de A morte feliz, livro no qual a trama narrativa gira em torno de um personagem que assassina um velho debilitado, com pleno consenso da vítima, e rouba os bens do ancião para viver com a companheira em um chalé à beira de uma praia francesa, na mais tranquila das pazes, desconstruindo, assim, o que considera como um mito covarde e burguês no dizer de que "o dinheiro não traz felicidade", me surpreendeu, mais uma vez, com a carta que escreveu ao seu tutor da infância - após ter recebido o prêmio nobel de literatura - em 1957.
Segue aqui transcrito trechos da carta de Camus ao professor Germain:

19 de novembro de 1957
Caro Monsieur Germain,

Deixei que passasse um pouco o movimento que me envolveu todos esses dias antes de vir-lhe falar-lhe de coração aberto. Acaba de me ser feita uma grande honra que não busquei, nem solicitei. Mas quando eu soube da novidade, meu primeiro pensamento, depois de minha mãe, foi para você. Sem você, sem essa mão afetuosa que você estendeu ao menino pobre que eu era, sem seu ensino, sem seu exemplo, nada disso teria acontecido. Eu não faço questão dessa espécie de honra. Mas essa é ao menos uma ocasião para dizer-lhe o que você foi e é sempre para mim, e para assegurar-lhe que os seus esforços, o seu trabalho e o coração generoso que você coloca em tudo que faz, sempre de maneira viva com relação a um de seus pequenos discípulos que, não obstante a idade, não cessou jamais de ser seu aluno reconhecido. Eu o abraço com todas as minhas forças.

Albert Camus.


A carta e a resposta de Germain foram anexadas a edição de O primeiro homem, pela então viúva do escritor Francine Camus, após o falecimento precoce do autor, em um acidente, no ano de 1960. Portanto, se fez uma literatura ácida, muitas vezes, em relação as atrocidades cometidas pelos colonizadores franceses aos povos árabes, o escritor era dotado também de um indisfarçavel humanismo que aflorava nas mais inóspitas e absurdas situações que narrava.


2 comentários:

  1. Estou lendo A Peste de Camus.
    A Peste mostra que a perspectiva da morte modifica a postura do homem perante o mundo e a si próprio, redefinindo valores e crenças e gerando perdas e ganhos, como o resgate da essência das relações humanas. Além de trazer conceitos que permeiam toda a obra de Camus, o romance se relaciona com as teorias de Heidegger, como a angústia. A aproximação com o autor de Ser e Tempo se estende também à concepção de morte, tema recorrente à filosofia heideggeriana.

    ResponderExcluir
  2. Existe um filme baseado nessa obra dele. Sim, também acredito que para Camus, de forma semelhante a Heidegger e Sartre, somente a angústia e a sensação de desamparo diante do nada podem conduzir o homem a exercer suas faculdades existenciais com plenitude. obrigado pelo seu comentário! :^)

    ResponderExcluir