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terça-feira, 12 de outubro de 2010

Nos bastidores de "Ronda da noite" de Rembrandt

Bom, antes de tudo, não se trata de um post com link para download. Trata-se apenas de uma dica cinematográfica. Nesse feriado, aproveitei, entre outras coisas, para ver alguns filmes e pude adquirir a película Ronda da noite (2007), dirigida pelo inglês Peter Greenaway. É interessante perceber como Greenaway retrata o cotidiano do pintor holandês Rembrandt (1606 - 1669), que foi um dos grandes mestres da pintura européia e um exímio dominador do emprego dos efeitos da sobra e da luz na pintura, bem com as tramas que envolveram a pintura do polêmico quadro Ronda da Noite.


Para Greenaway, por meio da pintura Ronda da Noite, que deveria representar um grupo de burgueses em poses heroícas prontos para defender Amsterdã, Rembrandt realizou uma denúncia de assassinato. O crime teria sido cometido a mando da figura central do quadro. Então, por meio de pistas simbólicas, manifestadas de forma alegórica, como, por exemplo, a garotinha que aparece correndo em meio a tropa, que seria a filha bastarda do líder da milícia, o pintor holandês almejava colocar sob suspeita também a índole moral e ombridade dos soldados. Essa intenção é nítida nos traços afeminados de dois milicianos, a direita do quadro, que segundo Greenaway, eram enamorados e na forma desengonçada pela qual um dos soldados carrega seu mosquete, a esquerda.

Rembrandt realizava seus desenhos e pinturas com uma precisão cirúrgica. Para ele, ao imortalizar uma pessoa em um quadro, o contexto que a cercava deveria ser também relevante. Por isso, o pintor holandês representava seus modelos de acordo com a personalidade que achava que eles possuíam. Daí justificar porque quase sempre pintava as pessoas com cara de idiotas. Baixinho, atarracado e de personalidade forte, além do profundo abalo emocional que sofreu com a morte de sua esposa, Saskia, Rembrandt teve de lidar com o ostracismo e a miséria após perder o prestígio e proteção dos mecenas com à realização do quadro Ronda da Noite. Mas para muitos historiadores da arte, esse fato também foi fomentado devido ao estilo de pintar do artista, que já estava perdendo espaço nos salões de arte.

Fica essa dica de filme. Ronda da noite não é para ser visto apenas por amantes da arte. A trama policialesca que envolve todo o filme, as representações do cotidiano conturbado, bem humorado e dramático do pintor e a atuação genial de Martin Freeman como Rembrandt possuem todos os elementos que um bom filme precisa. Pode ser até que para uma pessoa ainda não iniciada no universo da interpretação das obras de arte, Ronda da noite sirva como estímulo para que essa pessoa busque realizar suas próprias interpretações sobre obras de arte. Êis aí um dos grandes méritos do filme de Greenaway.




2 comentários:

  1. Olá moço.

    Depois dessa vou ter que procurar a "película" na conhecida Célia dos Bancários.

    Bom, o seu texto me pareceu um pouco com a análise que Foucault (já tô vendo a tua cara) fez em "As palavras e as coisas", sobre o quadro "As meninas", em que vão se delineando os interstícios simbólicos da obra, entremeados de conceitos e indicações. Claro que em Foucault trata-se de questões ligadas à representação, mas notei um certo cuidado em analisar quadro a quadro, personagem por personagem, que me fez rememorar a leitura densa daquela obra.

    Muito bom. Essa linha existente entre representação artística e realidade sociocultural é realmente muito tênue (se é que ela existe). Com relação às interpretações pessoais acerca da arte, uma nuvem às vezes quer dizer chuva, outras vezes quer dizer a supressão visual do sol, que continua a explodir atomicamente.

    Abraço.

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  2. Há quem diga que "As palavras e as coisas" seja o livro mais estruturalista de Foucault, o que deixa qualquer militante pós-modernista, hiper-modernista ou seja lá como preferem chamar essas correntes,de cabelo em pé. Talvez, em uma alusão bastante cruel, o próprio Foucault não teria ficado de cabelo em pé se assim sua obra fosse rotulada na sua frente.
    Eu tenho plena certeza de que o estilo e a história, representação e realidade, não se excluem, mas estão estreitamente entrelaçados e qualquer pessoa que defende o mero jogo retórico, a mentira e o cinismo como epistemologia deve procurar tratamento. No mais, meu grande amigo, é uma satisfação contar, por aqui, com suas guapas reflexões.

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